Introdução
A educação que será tratada aqui vai de encontro com a educação do futuro de
Morin (2000):
Educar
para compreender a matemática ou uma disciplina determinada é uma coisa; educar
para a compreensão humana é outra. Nela encontra-se a missão propriamente
espiritual da educação: ensinar a compreensão entre as pessoas como condição e
garantia da solidariedade intelectual e moral da humanidade. (p.93).
A educação pretende ser multicultural; encontra na complexidade das relações a
unidade e não se dá o prazer de extinguir a diversidade, pois é nesse conjunto
de identidades que as vivências encontram o sentido daquilo que é humano; os
conhecimentos globais passam a ser essenciais para a compreensão dos
conhecimentos locais; as relações mútuas e a reciprocidade são preceitos para a
compreensão da totalidade e do mundo complexo: a parcialidade e a simplicidade
são oposição à educação do futuro; o estudo da incompreensão é favorável
para o desenvolvimento da compreensão e diminuição das discriminações e da
barbaridade e promoção da diversidade e das identidades; compreender que por
mais que a sociedade possua controle sobre o indivíduo, este consiste numa
relação bilateral em que o indivíduo também controla a sociedade, o que traz a
ideia de espécie humana num pensamento planetário (tríade
indivíduo/sociedade/espécie) (MORIN, 2000).
Partindo
disso, esboçam-se duas grandes finalidades éticopolíticas do novo milênio:
estabelecer uma relação de controle mútuo entre a sociedade e os indivíduos
pela democracia e conceber a Humanidade como comunidade planetária. A educação
deve contribuir não somente para a tomada de consciência de nossa Terra-Pátria,
mas também permitir que esta consciência se traduza em vontade de realizar a
cidadania terrena. (MORIN, 2000, p. 17-18).
Outro
objetivo deste artigo consiste em mostrar como que esta educação (uma educação
de todos para todos) é limitada pelo capitalismo, que não procura desenvolver o
respeito mútuo e a reciprocidade, a consciência, a compreensão, a diversidade
ou preservar identidades, e como esse sistema trabalha para colapsar todo e qualquer
tipo de relação que tende à complexidade, ao encontro do todo, para limitá-la à
obediência, conformidade, passividade, docilidade, dominação, hegemonia e ao
combate numa arena simbólica, sendo estes os preceitos da educação do
capital para o futuro, em que o público não se expande para atender a todos,
torna-se cada vez mais privatizado, atendendo a poucos.
O público é a abertura para a
complexidade, a educação que tenta encontrar formas de ser pública e complexa
encontra entraves no privado e simples, presente no discurso que enaltece o
capital. A defesa que será feita à democracia tem a intenção de defender uma
distribuição do poder que não o torne um sistema retroativo às classes
políticas dominantes; busca garantir direitos de forma que todos consigam atuar
como cidadãos; privilegia o espaço público e democrático como forma de educação
essencial a toda e qualquer pessoa; menciono ainda a importância da escola
pública, gratuita e de qualidade como instituição fundamental para garantir uma
educação que promova a dignidade e o autoconhecimento de seus sujeitos
históricos, nunca se esquecendo que por mais fundamental que ela seja, não se
encontra isolada contribuindo para a educação do futuro.
Sabendo que vários preceitos do
capital acontecem sob uma perspectiva do mundo do trabalho, é visto a
importância de elenca-lo à discussão público/privado, pois se entende que o
trabalho nessas duas situações tende a acontecer de forma diferente e com
valores diferentes. Um segundo preceito é de que o trabalho corrobora para a
manutenção de um sistema econômico que barra a possibilidade da educação
acontecer em sua diversidade. Em contrapartida, entende-se aqui que a educação
pretende ser democrática porque esta forma de organização das decisões visa a
complexidade das relações e a abertura ao complexo acontece em situações que
favorecem o espaço público.
Da divisão do
trabalho à divisão da educação
Para explicar como a educação
cinde frente ao capitalismo, entenderemos que a educação é incluída como
essencial para o mundo do trabalho e será colocada próxima ao pensamento
marxista sobre as relações de trabalho, e posteriormente deslocada para uma
concepção pós-moderna do trabalho na educação.
Primeiramente, o trabalho
“Trata-se antes de um modo de manifestar a vida, a sua maneira de viver. A
maneira pela qual os indivíduos manifestam a vida é a sua maneira de ser”
(PAOLI, 1980, p. 17). O trabalho toma outras proporções quando se compreende
que ele gera um produto que pode vir a ser uma mercadoria de troca, por sinal,
um elemento de suma importância no capitalismo é a mercadoria produzida pela
força de trabalho; trabalhar para o capital é subsumir-se a valores de troca e
alienar o valor de uso da mercadoria, pensando as mercadorias no processo de
troca como valor: sendo comum a lógica de trocar dinheiro por mais dinheiro,
umas vez que ele representa o valor da mercadoria que será trocado por outro
valor. O capitalista se caracteriza por estar consciente do movimento do
capital, não tratar do valor de uso ou do lucro isoladamente, mas do incessante
movimento de ganho, que é sustentado pela mais-valia[1] (MARX,
1996).
Para produzir uma mercadoria é
essencial que se conheça os meios de produção que a originam. Porém, o
conhecimento sobre os meios de produção costuma ser detido por um proprietário
que troca um salário pela força de trabalho de um agente transformador, o trabalhador.
Essa separação entre o proprietário dos meios de produção e o trabalhador que
vende sua força de trabalho individual para realizar uma atividade simples e
genérica, segundo Marx (1996), acontece em sociedades onde a divisão social do
trabalho não consegue transparecer todos os processos de produção e
distribuição de um produto. As relações numa sociedade de produtores de
mercadorias consistem em desconhecer o processo material de produção da vida, o
que implica um desconhecimento entre o produtor e a natureza (MARX, 1996).
A educação complexa não se
conformaria no trabalho pensando no processo de produção para a troca, seria
muito mais coerente pensar a utilidade que o produto desse mesmo processo
possui para as necessidades humanas.
É a partir da ideia de acumulação
que o capitalismo torna-se uma ameaça à educação. A concentração dos meios de
produção pressupõe dominação de um grupo sobre outro: os grupos que detém os
meios de produção estão mais aptos a compreender a realidade com mais facilidade
do que aqueles que desconhecem esses mesmos meios, daí, os detentores dos meios
de produção estão em situação de privilégio e podem alienar as condições de
trabalho dos seus subalternos (MARX, 1996).
“É um produto da divisão
manufatureira do trabalho opor-lhes as forças intelectuais do processo material
de produção como propriedade alheia e poder que os domina” (MARX, 1996, p.475)
– criam-se funções específicas que requerem forças de trabalho específicas, o
que culmina para extinguir o ambiente democrático. Separa-se teoria e prática,
quando na verdade toda teoria (atividade intelectual) pressupõe uma prática
(atividade mecânica) ou baseou-se em práticas para ser pensada e a prática
provém de uma teoria ou a possibilita; elas estão inter-relacionadas e inseparáveis.
As especializações ranqueiam os saberes, não auxiliando na construção de um
ambiente aberto a todos, não considera todas as participações com peso de
decisão igual por classifica-los e restringir sua participação ao espaço ao
qual foram destinados pela classificação.
Passa-se a conhecer cada vez
menos as condições de produção do mundo material e a considerar natural o que
antes era explicado por uma etapa dos meios de produção. A naturalização das
coisas, por conseguinte, é trabalhada pela inculcação de ideias que tendem a
alienar o trabalhador, que alienado, desconhece os meios de produção
necessários para compreender a totalidade ou complexidade de seu trabalho.
A classificação é inculcar a
ideia num corpo sobre como deve ser natural a separação dos trabalhadores por
tipo técnico. E mesmo que um curto período de aprendizagem dessa técnica seja o
suficiente para qualifica-lo para o trabalho (o que demonstra a intensidade da
fragmentação dos saberes) deve parecer banal que essa classificação em saberes
seja sua alçada para posições de poder (PAOLI, 1980).
O que antes era a união de
trabalhadores parciais tornam-se operações cada vez mais subdivididas e funções
exclusivas de um trabalhador, assim “os processos de transformação levam cada
trabalhador-artesão a perder pouco a pouco a sua capacidade de exercer o seu
antigo ofício em toda a sua extensão, ficando sua atividade reduzida a uma
operação específica típica de uma função apenas” (PAOLI, p.24, 1980). O
trabalhador-artesão não é menos que um artista que com o tempo é luxado de suas
técnicas criativas, como exemplifica Mészáros (2008). A educação possui uma
concepção artística e criativa que é perdida em meio ao capitalismo pela
fragmentação do trabalho.
Aos poucos as funções são hierarquizadas de acordo com o
tempo necessário para realiza-las, o que passa a ser medida de valor e pede
qualificação da força de trabalho, pois se entende que existem trabalhos
“complexos”, “superiores”, “difíceis”, em detrimento dos trabalhos “simples”,
”inferiores”, “fáceis” (PAOLI, 1980). A qualificação da força de trabalho
acontece mediante a passagem dos indivíduos pelo ensino, qualquer distinção de
formação está entregue ao sistema de ensino: a diferença entre um aluno e um
funcionário da mesma instituição é o tempo de estudo, o que não implica
necessariamente num conteúdo a ser aprendido, preza-se o cumprimento de rituais
(a passagem pelo sistema de ensino) (ILLICH, 1985); e entre os trabalhadores a
estratificação da qualificação da força de trabalho tomam representações com
pesos significativos, principalmente quando diz respeito entre os cargos de
gestão educacional, professores e cargos administrativos, em que os primeiros
são mais valorizados em detrimento dos últimos. Ou ainda, os professores serem
diferenciados pelas suas disciplinas de acordo com o valor instituído por essa
força de trabalho no mercado[2], ou seja, o quanto se
consome essa mercadoria, o quão vital ela é no mundo, a demanda que ela gera. E
não é nenhuma surpresa, pois quando se vende a força de trabalho ela é
recompensada com um salário equivalente a força de trabalho num certo período
de trabalho.
Entende-se que a instrução
escolar, o tempo de estudo e de aquisição de conhecimento é o que agracia
determinadas posições sociais com o poder de comandar. As relações horizontais
da democracia foram transformadas em relações verticais, em que o prestígio das
funções superiores justifica a distribuição diferencial do poder; “Despossuído
do conhecimento, o trabalhador parcial torna-se um subordinado no processo de
produção” (PAOLI, 1980). Pensando num processo gradual, a naturalização do
processo de privatização não acontece com aqueles que experimentaram suas
habilidades produtivas nos espaços democráticos não-classificatórios, são as
pessoas que não participaram desses ambientes democráticos que estarão
relegados à lógica do capital num sistema corporativista, que aceitarão de bom
grado uma realidade que nunca se mostrou de outra forma. Se o ambiente não
provoca desequilíbrios (PIAGET, 2001), se o capital é visto como ordinário,
comum, normal, sempre esteve lá, como podemos esperar estruturas de pensamento
diferentes?
Os ambientes democráticos não
existem sem conflito (MIGUEL, 2011): são por excelência espaços
desequilibradores. Os saberes são compartilhados, distribuídos, reformados,
repensados, integrados nas relações entre agentes.
A qualificação da força de trabalho é avaliada pela
escolarização de um indivíduo, consagrando-se sua força de trabalho individual.
A escola funciona nessa lógica como filtro de habilidades e talentos, ou ainda,
seleciona os alunos bem dotados possuidores do dom (BOURDIEU
& PASSERON, 1975). A serviço do capital, a escola faz nada mais que
separar a mão de obra qualificada da mão de obra desqualificada.
Escolaridade, nesses moldes, é sinônimo de produtividade, definindo as
condições de existência[3] dos grupos (PAOLI,
1980). Compreende-se pelo esquema da Ilustração 1 (Condições de Existência de
Classe no Capitalismo) que são essas condições de existência que tornam natural
desigualdades e põem igualdade de oportunidades sob um discurso que vê a escola
como instituição neutra para todos que estão nela, fazendo com que as
determinações de uma classe que não compartilhe das concepções discursivas dos
saberes dominantes sejam excluídas automaticamente do sistema educacional ou
estejam relegadas ao insucesso, ao adentrar o sistema. (PAOLI, 1980).
As relações de produção
estabelecidas são ideológicas, provindas dos aparelhos de hegemonia (GRAMSCI apud PAOLI,
1980), faz-se de cima para baixo na pirâmide de classes: os dominantes, no
topo, direcionam intelectual e moralmente a base, os dominados. O que denota
uma violência simbólica (BOURDIEU, 2003; BOURDIEU & PASSERON,
1975) sentida pelos dominados, que devem adorar os gostos, preferências,
política e cultura de seus superiores. “(...) Ao internalizar as onipresentes
pressões externas, eles [os dominados[4]] devem adotar
as perspectivas globais da sociedade mercantilizada como inquestionáveis
limites individuais a suas aspirações pessoais.” (MÉSZÁROS, 2008, p.45).
A escola não daria conta de
diminuir o peso simbólico que a ideologia dominante faz recair sobre os
dominados, pensar nessa possibilidade é acreditar que a instituição escolar
pode resolver formalmente as questões da educação, porém, pensar que a escola é
parte do sistema educacional nos permite ampliar a visão sobre as demais partes
da educação, que comportam a totalidade da educação. É pensando numa alternativa
concreta abrangente situada nas soluções essenciais (que
comporta as soluções formais) que Mészáros (2008) situa a lógica do
capital.
A realidade, desprovida de desequilíbrios, possui a seguinte
natureza: “a qualificação torna-se o critério legitimador da diferenciação
social, e a possibilidade de ascensão social via qualificação se torna a
liberdade de fugir-se às determinações de origem” (PAOLI, 1980, p.31).
Instalada a ideia de igualdade de oportunidades, as distribuições desiguais de
saber e poder ficam turvas para os adeptos desse mito, que mais tarde formará
afeições religiosas com essa superestrutura que normaliza as relações
desiguais; as instituições tocadas pelo capital estão sujeitas a lógica do
mercado, um Deus que vigia e pune seus pecadores e infiéis (ILLICH, 1985).
A partir daqui podemos ter uma
ideia clara de dominação e sua realização a partir do acúmulo desigual de
capital. Sabendo que o capital é extrovertido e possui o toque de Midas[5], toma para a sua lógica qualquer sistema, instituição,
estrutura ou prática. O pensamento de Bourdieu torna-se mais que necessário
para expandirmos a ideia de capital econômico para o capital social, o capital
cultural e o capital simbólico. A exploração do trabalhador - do operário pelo
seu superior - em Marx (1996) consubstancia-se com questões imateriais,
construídas a nível de pensamento, mas que se formam na materialidade da
realidade vivida. A hegemonia econômica não é somente econômica, é também uma
hegemonia social e cultural, onde a moral, a linguagem, o comportamento, a
estética e os valores daqueles que tiveram seu sucesso reconhecido pelas
instituições sociais, podem circular no mercado de bens simbólicos (BOURDIEU,
2003). No mercado as trocas não acontecem apenas com dinheiro; no mercado
circulam mercadorias com valor, e as bases para esse sistema econômico
pressupõe que tudo tem potencial para se tornar mercadoria, inclusive a arte,
que pode ser interpretado de forma mais abstrata, pelo senso estético de um
grupo e a legitimação a um estilo artístico específico: criar o bom gosto por
traços retos e não curvos, pela perfeição da imagem à sua distorção, retratos
de momentos históricos a paisagens, situações políticas (público) a
psicológicas (privado), antiguidade a modernidade. Com esses mercados
invisíveis existe a disputa por determinados tipos de capital e tentativas de
subverter a ordem estabelecida em prol de um capital mais legítimo. Mészáros
contribui para a discussão ao dizer: “Aqui a questão crucial, sob o domínio do
capital, é assegurar que cada indivíduo adote como suas próprias as metas de
reprodução objetivamente possíveis do sistema” (MÉSZÁROS, 2008, p. 44), e do
sistema dominante, nas palavras de Bourdieu, ou hegemônico, para Gramsci.
Passa-se a falar de uma
internalização dos signos[6] e estruturas sociais,
e falando num sistema capitalista, onde a competição, as desigualdades, o
mérito e o pensamento individual são valorizados, ou são partes integrantes do
ambiente, não podemos esperar que a educação não-formal das mentes e dos corpos
não os adaptem as suas condições de existência – o habitus capitalista.
Dewey (2011) mostra que o indivíduo vive experiências num
ambiente que é determinante para sua educação e como a experiência é
insubstituível (viver ambientes democráticos provoca uma sensibilização maior
do que estuda-los a distância); Montessori ([19-]) e Piaget (2001) estudaram a
fundo as mudanças que o ambiente provoca ao longo do desenvolvimento infantil;
Vigotski (1998) baseia o desenvolvimento do indivíduo na relação que este
estabelece com o outro, uma perspectiva mais ontológica que a filogênese de
Piaget; Freire (2012) reforça a educação libertária necessária de um sujeito
que vive sob a coerção de uma educação dominante. A grande área da Educação
possui em sua extensão trabalhos que ressaltam a importância do ambiente
democrático (DEWEY, 2011) ou fazem alusão ao diálogo crítico (FREIRE, ), à
reciprocidade e à moralidade ( VINHA, 2000), a construção de si em conjunto com
outros sujeitos (VIGOTSKI, 1998), a um ritmo próprio da criança
(MONTESSORI, [19-]), ao desequilíbrio que desacomoda as estruturas
internas perante novas assimilações (PIAGET, 2001). Por outro lado, a escola
“(...) constitui uma forma de adestramento pela qual o imaturo adquire hábitos
e incorpora concepções com as representações dominantes e sustentadoras da
sociedade” (PAOLI, 1980, p.65).
A disputa no campo social da
escola, que condiz com o presente recorte temático, situada por interesses de
um grupo dominante, é capaz de estabelecer quais saberes são necessários para
estipular o currículo. Pensa-se erroneamente que o currículo contém o núcleo de
todo aprendizado e que independente da região ele é essencial, ele é um cânone
cultural (TORRES, 2003); não se discute porque aprender português ou
matemática, e para ser mais preciso, não é questionado o ensino da análise
sintática e das operações básicas. É impressionante, por outro lado, pensar que
o currículo não é pronto, acabado, finalizado, atemporal, pois ele serve a uma
comunidade e, ao menos no Brasil, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (BRASIL, 1996), a construção do currículo passa por uma
gestão democrática composta por gestores, professores, alunos e a comunidade
(pais, moradores, alunos, interessados em educação).
A diversidade curricular e
possíveis mudanças nele que beneficiem os estudantes a desenvolver suas
habilidades, motivações, inteligências e a participar de seus espaços sociais,
viver suas próprias culturas, são massacradas por uma extensa subdivisão dos
meios de produção citadas anteriormente, que a este ponto, podem ser vistas
como fragmentação da realidade e a criação de disposição a aceitar sua condição
social e acolher a cultura dominante. “(...) A educação deve promover a
“inteligência geral” apta a referir-se ao complexo, ao contexto, de modo multidimensional
e dentro da concepção global.” (MORIN, 2000, p.39).
Capitalismo,
democracia e poder
A lógica empresarial,
meritocrática e tecnocrata, conta Mészáros (2008), divide a humanidade entre sujeitos
e objetos, os primeiros são constituídos de intelectualidade, consciência
de classe, padrões civilizados e esclarecidos, enquanto os últimos são
anárquicos, alienados, manipulados, subvertem o sistema, e precisam que os sujeitos -
uma minoria que detém quantia considerável de saber-poder -, atue como
consciência dos objetos. Isto consiste numa inversão entre
dominantes-sujeitos e dominados-objetos e preservação das funções do capital.
Ainda segundo Mészáros (2008), as mudanças das concepções internalizadas pelos
sujeitos nesses regimes de conformidade a serviço do capital surgem na medida
em que se alimenta a contraconsciência, atividade e efetividade com uma
educação abrangente, não restrita às instituições formais; devem sustentar-se
em aspirações emancipadoras com objetivos concretos sustentáveis, basicamente:
não limitar-se à utopia.
Neto (2004) compreende que as forças econômicas do neoliberalismo desarticulam
a formação de grupos políticos, interferindo na formação cidadã da sociedade.
Ele faz uma defesa à educação pública para todos; ressalta inúmeras vezes como
o terceiro setor não é suficiente nem adjacente às concepções universais de
educação e outros direitos sociais, e como a democracia se desfaz realçando os
direitos individuais em decorrência do bem-estar social. Como já foi mencionado
neste texto, o capital transforma as condições de existência para impor sua
própria realidade; quando o capital participa da lógica da realidade, adapta os
corpos e mentes ao habitus capitalista com tamanha facilidade que
tende a enraizar-se no cotidiano priorizando vontades individuais sobre as
vontades coletivas.
A cidadania, decorrendo de uma pedagogia participativa, ativa, engajada e
autônoma, fracassa com o desmantelamento do debate político gerado pelos
valores trazidos pela lógica da produtividade e competitividade ligada às
empresas e a gestão privada. De forma mais concreta, as vias da privatização
tendem a “transferir os gastos públicos do ensino superior para os outros
níveis de ensino (principalmente o ensino fundamental) (...)”, culminando na “
(...) privatização do ensino secundário e superior e redução dos gastos por
aluno em todo os níveis de ensino” (NETO, 2004, p.26). Com o pretexto das
reformas educacionais sob o critério da equidade, “enfatizando o importante
papel da educação como estratégia de mobilidade e igualdade social” (NETO,
2004, p.27), percebe-se uma tentativa de ajuste na base, que tenderia a igualar
as condições de existência de classes, abarcando, entre tantas pessoas, aquelas
que vivem com péssima qualidade de vida, que estão sujeitas a violência, à
pobreza, a marginalização, à exclusão.
O único inconveniente desse raciocínio é o ensino médio e o ensino superior
convertidos em instituições privadas e inalcançáveis para as classes mais
desfavorecidas, sabendo que a antiga medida de garantir equidade não acontece
de forma imediata: a partir do momento em que se institui um novo sistema
político-econômico. Por mais que se pense na educação como instituição de
condições de igualdade, inclusive igualdade de oportunidades, há de se pensar
na realidade social como diversa e múltipla, com inúmeras formas de atribuir
sentido à realidade. A igualdade de oportunidades acontece com o estreitamento
da significação sobre o mundo, que é claramente um açoite da violência
simbólica sobre as formas de ser, de se constituir, de perceber o outro e de
perceber-se por instituir um cerco curricular com conteúdos que se restringem a
um número de significações pouco representativo comparado com a demanda perante
a qual o Estado oferta educação.
“O Estado surge como a esfera das
supraestruturas jurídico-políticas para reprodução das relações de
produção a partir da subsunção real do trabalho ao capital” (PAOLI, p.43,
1980). Seria de sua responsabilidade a administração do espaço público e de
suas decisões, sobretudo, de responsabilizar-se com o que acontece nele. Porém,
quando a máquina política que possui poder de justiça sobre a sociedade está
nas mãos de pessoas que servem a interesses pessoais e a corporações, a justiça
passa a agir com dificuldade.
A cidadania definha em conjunto
com o debate político quando a internalização do capital não tende à
diversidade, multiplicidade, pluralidade e ao estranho – a realidade externa a
nós, outras realidades, o outro. Porém, é em alguma medida concreto o
suficiente para ser inserido na realidade de quem estranha quando vivencia essa
realidade-outro e estabelece uma relação dialógica com ela. Fazer acontecer um
ensino de qualidade numa sociedade desigual (sem igualdade de oportunidades)
não anula a história dos sujeitos, apenas diminui a carga da violência
simbólica que eles sofrerão e que sua trajetória de vida não será suficiente
para definir suas condições de existência; privatizar o ensino tende a impedir
a continuidade da educação pela recusa em enxergar qualquer desigualdade, como
se todos trabalhassem no mesmo ritmo, estivessem sincronizados, possuíssem a
mesma história, vivências tão semelhantes a ponto de a igualdade concreta ser verdadeira.
Na privatização o mercado é o
grande consultor da educação, já que o capital é seletivo e preserva a
desigualdade de classes. É inconsistente uma educação pública que se compromete
com excluir, criar limites, atuar como impedimento, reprimir, oprimir quem faz
uso dos espaços públicos de educação, que acabam sendo os resultados de uma
educação praticada sob a tutela do capital.
Pensando no capital como um
disciplinador, no sentido atribuído por Foucault (2011), ele vigia e pune os
indisciplinados pelas instituições responsáveis por fiscalizar o ensino,
impedindo a convivência entre disciplinados (aqueles que obtiveram sucesso nas
avaliações) e os indisciplinados (os que fracassaram nas avaliações). Aqui
recai a estratégia da responsabilização apontada por Freitas (2012):
as escolas recebem testes avaliativos feitos pelos estudantes, seguido da
divulgação pública dos resultados; a bonificação dos melhores professores
e das melhores escolas ressalta a competição profissional e
estrutural das instituições escolares: focando nos resultados, adquirem
processos mais eficazes para aumentarem os valores numéricos das avaliações,
pondo de segundo plano a educação integral, substituindo-se os tempos variados
de aprendizagem pelo tempo do produtivismo, arbitrariamente imposto pelos
detentores de saber-poder dessas mesmas instituições; por fim, Freitas (2012)
menciona o começo da privatização acontecendo nas escolas que não alcançam os
resultados esperados, sendo responsabilizadas pelo seu fracasso no processo de
ensino dos alunos e transferindo o bem público de incumbência do Estado para a
iniciativa privada.
Diversos
grupos, organizações ou mesmo indivíduos podem almejar a posição de porta-vozes
de determinadas visões políticas ou interesses sociais. Nem todos, porém, têm
capacidade de se colocar na esfera pública de maneira a reivindicar tal
posição. São necessários recursos materiais e simbólicos, providos muitas vezes
pelo Estado, por fundações privadas, por organismos multilaterais como o Banco
Mundial ou por redes transnacionais de advocacy. Se, na ausência de
mecanismos de controle e autorização, essas organizações não prestam contas
àquelas cujos interesses dizem representar, devem prestar contas a seus
patrocinadores (MIGUEL, 2011, p.51).
Até o presente momento,
entende-se que a escola possui responsabilidades com a educação de seus
estudantes e a queda do rendimento deles nas avaliações é responsabilidade
dala. Os estudantes com seus diversos ritmos e aprendizados pré-escolares e
não-formais não podem sofrer nas mãos das instituições pelos frutos de um
ambiente social e cultural distante de como a escola percebe a educação,
sobretudo a concepção de educação integral[7].
Ressalta-se que isso não pode acontecer pela obrigação que a escola possui de
ser inclusiva e trazer para seu espaço formal qualquer educação informal ou
não-formal que contribua para a educação, lato sensu, do usuário do espaço
escolar.
As plataformas competitivas
geradas pela bonificação dos resultados são impulsionadas pelos valores do
capital. Quando o Estado abre mão de parte da educação pública e a confere a
uma instituição privada, não o faz porque está acordado em Lei, mas porque os
representantes públicos da educação possuem valores que convergem aos interesses
do capital e sugerem a iniciativa privada sob o discurso dela ser a solução
para evitar o fracasso escolar que se torna mais comum com a queda da
qualidade do ensino público, temendo que esse fracasso se torne irreversível.
Os interesses dos representantes nem sempre são os mesmos de seus
representados, e isso não acontece apenas porque eles possuem perspectivas
diferentes que afetam seus julgamentos e escolhas, a falta de mecanismos
institucionais de controle visando a autorização e a accountability permite
essa usurpação do poder (MIGUEL, 2011).
Retomando o tema do fracasso
escolar, é um termo controverso para Charlot (2000). Ele prefere trata-las por situações
de fracasso, pois não alimenta a ideia de que existem fórmulas para o sucesso
escolar e por isso bastariam condições ideais gerais para todos os alunos.
As situações de fracasso consideram as relações subjetivas que o
aluno estabelece com seu mundo a seu tempo, que não são as relações esperadas
pela instituição. As exceções ao fracasso escolar seriam os alunos que
estabelecem relações próximas ou semelhantes àquelas esperadas pela
instituição, sobretudo, não por uma força disciplinar da escola, mas por
interesses e motivações particulares desse ser que possui experiências[8]. A escola lida com situações objetivas e subjetivas que
não podem ser reduzidas a um ou outro termo, são ambas partes do processo de
ensino-aprendizagem; o ensino depende substancialmente da aprendizagem do corpo
sensibilizado por suas vivências, que levam o educando a apreender o mundo. Em
comparação, um ensino que pouco busca saber sobre os conhecimentos desse ser e
monta um currículo que lhe parece ser básico, que é imprescindível para sua
vivência, aplicando a violência simbólica a esse corpo por não permitir que ele
se eduque[9] de modo a privilegiar sua autonomia e
sua autoria[10] com relação ao seu próprio
conhecimento.
O capitalismo, inserido na
educação, objetifica os corpos e nega os sujeitos. Constrói modelos, prepara
formas, abusa do poder sobre as relações desiguais para uniformizar os seres.
Freitas (2012) mostra isto claramente quando menciona o estreitamento do
currículo que acontece como consequência das políticas de privatização –
política salvadora da educação nacional pela incapacidade da educação pública
gerir seus próprios recursos. Se a educação pública não consegue gerir seus
próprios recursos é porque existem possuidores de saber-poder que veiculam
discursos de verdade sobre o que é ou não é qualidade e tentam mostrar como a educação
para o trabalho[11] em detrimento da educação
integral é o que impedirá a miséria do país-nação, o que não é verídico,
considerando que esse sistema que preza o trabalho compulsivo não contribui
para a diminuição de desigualdades, incentivo a políticas afirmativas,
autonomia dos sujeitos, diminuição das violências, desenvolvimento da
moralidade e senso de coletividade; trabalha na contramão da educação que
atravessa os documentos oficiais nacionais (Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Brasileira (1996) e os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), por
exemplo) e internacionais (Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948))
que visam a reciprocidade e cidadania.
Torres (2003) argumenta que uma
das tensões existentes entre democracia e capitalismo é como os direitos
pessoais e direitos de propriedade acarretam a expansão do capitalismo, mesmo
que sigam uma lógica contraditória e conflitante entre esses direitos. O
capitalismo na democracia funciona com base nos negócios, na mercadoria, na
troca de bens, o que justifica a apropriação dos recursos sociais e, arguta,
conforma a sociedade ao gerar padrões éticos de comportamento social. Neste
sentido, segundo Torres (2003), democracia e educação não podem estar
dissociadas, pois os padrões de conformidade dirigidos à população garantem que
o capital possa continuar firme em desintegrar as interações entre classes,
raças/etnias e gêneros; não podemos, ademais, pensar que a educação se
restringe apenas às escolas, como insiste Mészáros (2008), pois isso seria
pensar na educação formal. Bourdieu & Passeron (1975) não cedem em
denotar na escola seu caráter distintivo, o filtro entre quem detém o capital
cultural daqueles que são incapazes de continuar no sistema por não possuírem o
capital exigido: a escola avalia um capital que é anterior a ela.
O capitalismo adentra a escola e
encontra espaço nela para se reproduzir informalmente (e até formalmente, se
esse for o desejo dos grupos dominantes); o capital mostra-se penetrante, capaz
de absorver o que se encontre diante dele e aplicar sua própria lógica.
Imediatamente concluímos que dentro e fora da escola a educação é permeada por
um pensamento consumido pelo capital, e como ele é incapaz de democratizar as
decisões, preferindo as divisões, estratificações, não-interações, heteronomia
e uma consciência dominada, que exalta os direitos pessoais em detrimento dos
sociais e vê em tudo uma propriedade, daí a possibilidade de afirmar seu
direito de propriedade a tudo também, seja um bem material ou imaterial.
Vale ressaltar as palavras de Morin:
Estamos
na era planetária; uma aventura comum conduz os seres humanos, onde quer que se
encontrem. Estes devem reconhecer-se em sua humanidade comum e ao mesmo tempo
reconhecer a diversidade cultural inerente a tudo que é humano (2000, p.47).
Em contrapartida, a educação do
capital acontece por meio da violência simbólica, que por uma perspectiva
foucaultiana seria tratado em termos de poder. Foucault (2011) mostra
perfeitamente que a educação pode trabalhar pela punição, mas segundo ele não
basta reprimir; a repressão deve possuir um conteúdo disciplinar, deve fazer o
indisciplinado perceber-se como tal e interiorizar esse valor, ele deve
sentir-se constrangido, envergonhado, como se tivesse feito algo imperdoável.
Ele precisa ter em mente que a punição foi merecida. Se o indisciplinado
acredita que sua ação é indisciplinada o poder de dominação de inscrever a
verdade naquele corpo está cumprida. As greves nas universidades, por exemplo,
com sua função homeostática nas políticas e normas aplicadas aos usuários
desses espaços, possuem seu saudoso efeito equilibratório elidido pela visão
dos grupos dominantes que a interpretam como um caso de indisciplina, somado,
ainda, à pretensão de construir um futuro profissional que não constará no
diploma se a greve for a escolha.
Esse valor é tão enraizado nos corpos que encontramos seus
traços já na criança que ouviu suas figuras de respeito e grande parte das
pessoas com que convive dizerem que ela precisa ser bem sucedida, conseguir um
bom trabalho, ter dinheiro para comprar quinquilharias; ela não trabalha, só
precisa estudar, e se já trabalha, pode conseguir um trabalho melhor - se não
se resignar com sua posição social (como quem diz isso não é para mim;
universidade é coisa de gente rica, gente inteligente, que quer estudar etc.;
ou ainda, o trabalho que tenho é o máximo que posso conseguir com meu
nível de estudo).
(...)
estes confrontos devem ser institucionalizados, de maneira que possam ocorrer
somente através de mecanismos, cujo funcionamento os faça parecer como não
diretamente político, o que permite a sua “suavização” (PAOLI, 1980, p.38).
Segundo
Vinha (2000), a moralidade pode ser resumida em como eu devo agir perante
o outro, está implícito que existe um julgamento e ele é considerado para
pensar suas ações socialmente. Os estágios da moralidade seriam a anomia,
heteronomia e autonomia, sendo a anomia associada ao egocentrismo[12] e a impossibilidade de seguir as regras; a heteronomia
à obediência às regras por conceber o outro como um ser diferente de si; e a
autonomia como situação em que o sujeito passa a criar regras no conjunto
social. “Quando os indivíduos se respeitam mutuamente e elaboram uma regra
sentem-se obrigados por ela” (VINHA, 2000, p.80), e é o bem-estar e a
satisfação que deveriam estar associados a norma, enquanto a autoridade e a
recompensa ao cumprimento da norma deveria ser evitado.
Elaborar uma regra ou norma e cumpri-la é, para Vinha (2000), um reconhecimento
ao sentimento do outro, prezar o respeito por si e pelos outros; o
desenvolvimento da moralidade deve passar pelo sentimento interior de
obrigação, diferente das medidas do capital que funcionam de forma a
estabelecer a heteronomia por punições e recompensas constantes, de forma que
os sujeitos nunca se tornam autônomos. Ser autônomo implica que “É preciso que
eles [os indivíduos] pratiquem primeiramente, vivenciando relações de igualdade
e democracia, para depois vir a consciência (e não esperar o contrário” (VINHA,
2000, p.80). Deste modo “Uma criança aprende o que vive e se torna o que
experimenta” (VINHA, 2000, p. 40), e experimentar a conformidade e obediência
exigidas do capital às estruturas sociais, políticas, economias e culturais está
longe de ser um ambiente educativo capaz de desenvolver as potencialidades
humanas.
Compreende-se que a existência de
um poder que submete os envolvidos na relação alimenta uma consciência
artificial, comandada por interesses dos grupos dominantes, não garante a
criatividade e a espontaneidade necessárias para enxergar a complexidade do
mundo. “O dever principal da educação é de armar cada um para o combate vital
para a lucidez.” (MORIN, 2000, p.33).
A criança, forma primeira do
sujeito, não trabalha apenas por imitação, coerção ou vigilância, ela possui
desejos, iniciativa para satisfazer suas curiosidades, é uma exploradora nata,
e assim ela segue para a fase adulta se o ambiente permitir, ou seja, “a
moralidade seria resultante das relações estabelecidas pelo sujeito com esses
ambientes” (VINHA, 2000), e Piaget (2001) e Montessori ([19-]) haverão de
ressaltar as influências que o ambiente possui sobre o desenvolvimento
infantil. Se um sujeito não possui uma educação esperada é porque o ambiente
não foi favorável para o desenvolvimento dela. E tratando-se de uma educação
pública, seria da responsabilidade do Estado garantir condições de uma educação
que promova o bem-estar de todos e nunca abrir mão dessa educação, pois é de
sua responsabilidade que ela aconteça. Enquanto o Estado garante educação ela
precisa ser de todos, em caso de iniciativas privadas, não necessariamente.
Aproximando-se da educação, os
estudantes, não participando dos espaços democráticos, onde acontece a
educação, ficam restritos a outros locais – os espaços privados. E quanto mais
desaparece o espaço democrático, maior a possibilidade que haja regras sem
importância para os estudantes nesses novos espaços (e que não seja possível
modificar a regra), uma vez que eles não participam da elaboração da regra,
podendo ela ser contrária aos valores de quem utiliza o novo espaço. Tenta-se
separar os estudantes-trabalhadores de suas condições objetivas de existência.
Segundo Vinha (2000), criar uma regra é atribuir valor a ela, é saber por que
ela é importante. “A necessidade de ser respeitado, equilibra, por conseguinte,
a de respeitar, e a reciprocidade que resulta desta nova relação basta para
aniquilar qualquer elemento de coação” (VINHA, 2000, p.50). Se todos colaboram
para criar a regra, se todos entendem porque ela está lá, compreende-se que ela
é mais do que um controle externo, ela é uma autorregulação. Educar para a
cidadania passa a ser um dos rudimentos de uma educação preocupada com a
construção das relações (SILVA, 2004).
A moralidade é essencial para que
concebamos humanidade no outro que vive as mesmas regras que nós e como é
importante despertarmos solidariedade e respeito mútuo para conseguirmos
perceber as diferenças, a diversidade, a multiculturalidade (MORROW & TORRES,
2003; TORRES, 2003) e como a meritocracia e a igualdade de oportunidade foram
mitos vividos em favor do capital privilegiando os detentores de saber-poder,
que por acaso são os criadores das regras, eles que atribuem valor à norma, e
se há desobedientes é porque eles não compreendem seu valor.
A norma não precisa ser seguida
apenas porque é norma, o que é um pensamento associado ao estado de
heteronomia; deve ser possível que se questione a norma e o valor da norma.
Quanto menos pessoas autônomas num mundo capitalista melhor para sua
perpetuação, o mesmo vale para a consciência crítica (FREIRE, 2012) e a
contraconsciência (MÉSZÁSROS, 2008): sem elas não há transformação.
Quando, neste trabalho, liga-se o
capital ao poder, entende-se que:
Se
o poder fosse somente repressivo, se não fizesse outra coisa a não ser dizer
não você acredita que seria obedecido? O que faz com que o poder se mantenha e
que seja aceito é simplesmente que ele não pesa só como uma força que diz não,
mas que de fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber,
produz discurso. Deve−se considerá−lo como uma rede produtiva que atravessa
todo o corpo social muito mais do que uma instância negativa que tem por função
reprimir. (FOUCAULT, 2006, p.8).
O poder, portanto, não se resume apenas a possuir uma posição de influência
política, receber um salário maior que o de outra pessoa, tomar decisões que
outras pessoas não podem; significa ser capaz de formar conteúdos nos corpos e
nas mentes, ser totalmente invasivo, conseguir criar o certo e o errado, fazer
cumprir interesses pessoais a partir de corpos docilizados pelo poder. Foucault
(2006; 2011) vê o poder como uma rede de interações, e a sociedade está sempre
acionando seus dispositivos e acabam tendo sua sensibilidade ao mundo induzida,
pois as estruturas de poder reagem sobre os corpos docilizando-os: o poder não
torna os sujeitos dos corpos livres para sentirem, ele conduz as sensações para
que os corpos estejam programados a fazer o que é esperado que façam. De forma
análoga, a violência simbólica de Bourdieu (2003) considera a
existência de estruturas estruturantes que agem como estruturas estruturadas,
culminando posteriormente no habitus. Dessas duas perspectivas percebemos
como os corpos podem ser moldados no sistema capitalista para cumprir os fins
deste último.
O capitalismo, por definição,
exige representação diferenciada no poder e na política, promovendo a injustiça
através do estabelecimento de hierarquias e do estímulo a interesses
competitivos, e a desigualdade através da operação de um sistema que visa
lucros. (TORRES, 2003, p. 68).
Considerações finais
As concepções dos grupos
dominados muitas vezes aderem aos interesses daqueles que detém o conhecimento
sobre o trabalho, portanto dos meios de transformar o mundo (MARX, 1996). E
mesmo que os grupos dominados se libertassem do poder dos dominantes pela
consciência crítica, nas palavras de Paulo Freire (2012), ainda teriam de
enfrentar toda uma burocracia política e econômica de seu tempo que só podem
ser reorganizadas com a materialidade que a realidade oferece e com a
consciência que os trabalhadores ou grupos dominados dispõem, ou seja, dos
meios de produção conhecidos ou possíveis de serem conhecidos (ou acessíveis) para
transformar a desigualdade de classes num plano justo para todos, onde as
relações de poder são mínimas.
O espaço público é primordial por
ser o local onde todos decidem, e é um espaço democrático em potencial: é onde
a acumulação acontece pensando sua posterior distribuição e a globalidade das
relações; é onde a moralidade e bom convívio são prestigiados; é onde a
responsabilidade social encontra eco em cada indivíduo participante,
simultaneamente, o pensamento ético visando a cidadania colabora para que a
justiça social garanta dignidade e bem-estar para todos: e espaço público é
onde o eu encontro o outro e interagem estabelecendo
relações, sejam elas de concordância, desacordo, conflito, consentimento etc.
Já o privado é o espaço que não é de todos, está restrito aos interesses
pessoais: está inserido no público, mas é para onde todos os cidadãos retornam
quando não estão pensando nas suas responsabilidades sociais; é propriedade,
logo, o direito de posse salienta que as decisões tomadas nesse meio não
precisam ser democráticas; por uma questão de valores, é onde se estabelece
mais facilmente o poder. O privado, nessa concepção, vê no público uma
potencial propriedade.
O mundo capitalista e globalizado
admite as desigualdades expostas pelo pensamento de Marx (1996), o acumulo
incansável de capital perde de vista a responsabilidade social, a ecologia nas
relações e a complexidade de uma era planetária (MORIN, 2000) para transformar
o capital público em bem exclusivo, um troféu ou medalha de honra para grupos
dominantes - detentores dos meios de produção que delimitam relações de
desigualdade e vivem delas (MARX, 1996).
Pensar o trabalho próximo da
educação é inextrincável pelo fato do trabalho influenciar a educação com
valores voltados para a produtividade e competividade. Valores de uma economia
capitalista. Educar hoje em dia é educar para o trabalho e educar para o trabalho
é educar para manter um sistema econômico. A educação de qualidade, por outro
lado, se interessa por capacitar o sujeito a ser autor de suas ideias, de
conviver harmoniosamente com outras pessoas, de saber resolver conflitos de
formas inteligentes, de experimentar seu corpo no mundo e produzir experiências
duradouras ou promotoras de novas experiências. Na contramão da educação
pretendida, podemos compara-la com uma guerra, como faz Illich (1985):
A
guerra do Vietnã serve como exemplo ao nosso raciocínio. Seu sucesso é
calculado pelo número de pessoas efetivamente servidas por balas baratas,
entregues a um preço elevado. E este cálculo brutal é desavergonhadamente
chamado “contagem de corpos”. Assim como negócios são negócios — um não acabar
de acumulação de dinheiro — assim a guerra é matar — um não acabar de
acumulação de cadáveres. De maneira semelhante, a educação é escolarização; e
este interminável processo é quantificado em horas-aluno. Todos esses processos
são irreversíveis e autojustificáveis. Pelos padrões econômicos, o país se
torna sempre mais rico. Pelos padrões de contagem de cadáveres, a nação
continua vencendo sua guerra eternamente. E pelos padrões escolares a população
torna-se sempre mais instruída (p.55).
Se
a escolarização garante um trabalho para o cidadão isto é suficiente, pois o
trabalho impulsiona o país na competição internacional e “Pelos padrões
econômicos, o país se torna sempre mais rico” (ILLICH, 1985, p.55), como consta
na citação anterior. O que não significa reverter todo esse sucesso em
educação. É mais provável a criação de formas de avaliação de habilidades para
qualificar o tipo de trabalhador necessário para fazer funcionar a máquina
econômica, o que exige uma demanda de diplomas no mundo do trabalho. Em Illich
(1985), podemos afirmar que as pessoas consomem educação para ter educação,
da mesma forma como se tem um carro, roupas, casa, quinquilharias em geral.
Conquistado um diploma, pensar no que você é não importa, pois ter o
diploma é suficiente, mesmo que ele não reflita sua trajetória na educação. O
diploma, em todo caso, é capital institucionalizado (BOURDIEU
& PASSERON, 1975), é parte do Mito do Consumo Interminável de
Serviços (ILLICH, 1985)
A
escola se presta efetivamente ao papel de criadora e sustentadora do mito
social por causa de sua estrutura que funciona como um jogo ritual de promoções
gradativas. É muito mais importante a introdução neste ritual do que
averiguar-se como ou o que é ensinado. É o próprio jogo que escolariza; ele
entra no sangue e torna-se hábito (ILLICH, 1985, p.57).
Capitalismo é o contrário de uma
educação de qualidade, e como se não fosse suficiente, não está interessado em
discutir educação. Educação não é economia, por mais que toda cultura tenha sua
economia e ela influencie na educação dessas culturas; educação não é trabalho,
por mais que ele seja, atualmente, o fim da educação formal. Educação é o
conhecimento sobre a Humanidade e um autoconhecimento que é direito
inalienável, que confronta o mundo do trabalho e o mundo puramente econômico
como conhecimento libertário.
A defesa à democracia como espaço
público acontece nesse sentido: o de ser possibilidade de reinvenção das
condições de existência das populações. Para não extinguir a educação de qualidade
é de extrema coerência que se mantenha a educação pública e gratuita, pois sua
qualidade, ainda que não garantida, só poderá ser pensada num ambiente em que a
educação não possui origem. Ela é uma matemática complicada sobre várias
culturas, é um processo histórico de seus sujeitos, é o pensamento das
diferenças, são variações linguísticas de uma riqueza inegável, são estilos de
vida que destoam, são tantas vozes, cores, formas, sabores e perfumes que
propor a educação de viés capitalista é suportar um estilo de trabalho e um
sistema econômico que não promove compreensão complexa da totalidade: está
longe de ser educação.
A educação do futuro é uma
educação que deve começar agora e deve estar atenta aos discursos que exaltam
interesses particulares e de dominação sobre o espaço público. Defender uma
educação do capital é conformar-se num estado de heteronomia; é dizer que está
tudo bem que outros decidam por mim porque eles me mostraram através de um
poder docilizante que eu não sou importante no processo de decisão. Como se
isto não fosse suficiente, as estruturas burocráticas das instituições quase
nunca favorecem o contato entre quem possui posições de poder e quem reivindica
mudanças.
Seguindo o pensamento moriniano encontramos que “Cabe à
educação do futuro cuidar para que a ideia de unidade da espécie humana não
apague a ideia de diversidade e que a da sua diversidade não apague a da
unidade” (MORIN, 2000, p.55).
Coadunando, Torres (2003) afirma:
Precisamos
de uma teoria da cidadania multicultural democrática que leve a sério a
necessidade de se desenvolver uma teoria da democracia que ajude a atenuar,
senão eliminar completamente, as diferenças, desigualdades e injustiças sociais
que permeiam as sociedades capitalistas, e capaz de abordar as tensões
draconianas entre democracia e capitalismo, de um lado, e entre as formas
democráticas sociais, políticas e econômicas, de outro (p.67).
A educação do
futuro não é uma utopia, é uma questão de tempo e de transformação das
interrelações globais que se apresentam rotineiramente, sempre pensando somos
todos agentes transformadores e que qualquer ação marca o mundo,
transformando-o. Não vivemos isoladamente, vivemos socialmente, e justamente
por isso convivemos, nos descobrimos convivendo e precisamos prezar a
convivência para viver conjuntamente. A convivência, entretanto, deve ser
reconhecida, experimentada com todas as energias de quem vive a relação, não
tolerada ou aturada. Para alcançarmos isso podemos pensar como alternativa para
a privatização do ensino uma educação para a humanidade e a globalidade das
relações, que deverá acontecer na escola pública, gratuita e de qualidade.
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[1] “Esse incremento [de valor], ou
o excedente sobre o valor original [de uma mercadoria], chamo de mais-valia (surplus
value)” (MARX, 1996, p.271). Para que isto aconteça, Marx (1996) afirma que
deve haver separação entre o trabalho e os meios de produção.
[2] O que gera diferenciações entre
cursos “moles” (letras, filosofia, pedagogia) e cursos “duros” (engenharias,
medicina, direito).
[3] As condições de existência podem
ser lidas como habitus de classe, gênero e etnias/raças: são as
condições subjetivas e objetivas que determinam como o sujeito se percebe, como
ele probabiliza seu sucesso, suas metas, seus possíveis destinos, como ele
enxerga sua trajetória social e se posiciona no futuro (sou capaz de fazer um
curso superior?; provavelmente não me aceitarão como trabalhador naquele lugar; eu
não deveria estar aqui, não sou como essas pessoas), sendo capaz de romper ou
não com sua posição social dentro do campo. (BOURDIEU, 2003).
[4] Originalmente, Mészáros (2008)
se refere aos trabalhadores. Como ele escreve sobre uma educação essencial (que
compreenda a totalidade das práticas educacionais), entendo que a
sensibilização das consciências ao capital aconteça nas mais diversas situações
de dominação. Substituir trabalhadores por dominados me
permite abranger os efeitos do capitalismo sem interferir na leitura que
Mészáros faz da educação capitalista, que é ampliar o entendimento sobre a
lógica do capital. Os trabalhadores são uma parcela da classe dominada atingida
pelos efeitos do capital.
[5] Na mitologia grega, corresponde
ao rei de Frígia que ao tocar os objetos, transformava-os em ouro.
[6] Podendo inclusive pensar a
internalização pelo pensamento vigotskiano (VIGOTSKI, 1998).
[7] Educação integral como
semelhança à solução essencial da educação em Mészáros (2008),
educação para além do capital, como uma autogestão, atendimento às reais
necessidades do ser, da automediação: expressão do “autocontrole e da
auto-realização através da liberdade substantiva e da igualdade numa ordem
social reprodutiva conscienciosamente regulada pelos indivíduos associados”
(p.72-73). Ou ainda como a educação pela experiência de Dewey que
deve proporcionar experiências que culminem na possibilidade de novas
experiências (2010).
[8] Os alunos com capital cultural
próximo dos interesses da instituição escolar não terão tantos problemas em
assimilar os novos códigos, o interessante é ver como alunos com capital
cultural distante dessa mesma instituição, por razões que apenas suas próprias
experiências o explicam, podem se aproximar desses mesmos códigos por interesse
próprio, assimilando-os mais comodamente por desenvolver um gosto verdadeiro
por aquilo que esta conhecendo, em comparação com a violência simbólica, que
possui a função de convencer o aluno que aquilo é o que ele quer.
[9] Maria Montessori ([19-]), em
sua pedagogia, parte do princípio que a criança é o centro de sua própria
educação, ou seja, ela é que dita os caminhos que ela precisa para os adultos,
sendo responsabilidade deles organizar o ambiente para propiciar a educação que
a criança mostra precisar. Desta perspectiva, a violência simbólica possui
parte apenas em como o ambiente é mobiliado e adequado à criança pelo adulto,
que é muito menor em comparação com as salas de aula e o currículo
pré-estabelecido. Os conhecimentos vitais partem, para Montessori ([19-]), das
necessidades situacionais da criança.
[10] Termo comum na pedagogia de
Paulo Freire (2012), que considera que o sujeito cria conhecimentos a partir
das interações com seu mundo. A ação gera transformação no mundo, e nessa
mediação acontece a apreensão da transformação que foi produzida pelo ser capaz
de realizar a ação, assim, a mudança possui um autor, que é um sujeito
histórico capaz de pensar o mundo que transforma.
[11] A educação para o
trabalho é pensada a partir do documento Uma Ponte para o Futuro (2015).
[12] Estado em que a criança
percebe a realidade indissociada de si e de suas sensações, por isso, ela não
se emociona ao ver uma criança chorando por ter se machucado. “Por que ela
chora se eu estou bem?” traduz o pensamento da etapa egocêntrica na criança.